segunda-feira, 20 de julho de 2009

O que é a Literatura de Cordel

Os versos da literatura de cordel trazem a simplicidade e a verdade do povo nordestino. O mundo é interpretado em rimas. As dificuldades da seca, do trabalho e da crueza da vida tomam forma em palavras cantadas, em poesia. A criação de histórias também abre espaço para o autor mostrar sua concepção de vida, suas crenças, seus preconceitos, suas certezas e suas dúvidas.
O desafio também é um grande exercício de imaginação. Confrontar outro cantador em palavras é um grande exercício de criação. Muitas vezes o poema impresso é motivo para improviso e a peleja se torna um jogo de rapidez e de sagacidade. Vence quem está com a verdade, com Deus ou que tenha a língua mais afiada, sem errar a rima.
Essa nova revista pretende apresentar para as novas gerações a Literatura de Cordel. Uma das mais expressivas das artes regionais brasileiras. Os folhetos têm geralmente do tamanho: 11 x 16 cm., com uma capa em uma cor, com 8, 16, 32 ou 48 páginas, impressos em tipografia (o que dá um aspecto diferente das publicações impressas em off-set, como a nossa própria revista) em papel jornal, expostos pendurados em cordões estendidos em uma banca (daí o nome) e vendidos em feiras e mercados.
Geralmente a venda é acompanhada pela cantoria dos versos pelo folheteiro (vendedor) ou pelo próprio autor. Algumas vezes acompanhados de viola e de pandeiro.
Sem periodicidade definida e uma tiragem significativa, as revistas de cordel expressam os sentimentos, as observações, a história, os personagens e o povo nordestino. Também comentam os fatos do dia-a-dia numa simplicidade e numa realidade sem igual.

Um pouco de história

A literatura de cordel tem suas origens na Europa, nos séculos XVII e XVIII. Eram romances populares chamados, na Inglaterra, de chapbook ou baladas; na França, colportage (mascate); na Espanha, pliego suelto e em Portugal, literatura de cordel ou folhas volantes.
Chegaram no Brasil no final do século XIX como forma de expressão popular que se insere em uma longa tradição de manifestações culturais. A cantoria, o improviso e os desafios oferecem aos leitores, geralmente as camadas mais pobres da população, versos contando histórias, noticiando fatos da vida política, social e religiosa e contando as agruras da vida do trabalho.
Os folhetos de cordel são vendidos por folheteiros que expõe seus volumes "a cavalo" pendurados em barbantes, em cima de caixotes ou mesmo espalhados sobre um pano no chão. São oferecidos em voz alta em feiras, mercados, portas de igrejas, em estações de trem ou rodoviárias ou em centros movimentados. As revistas também podem ser vendidas por vendedores ambulantes de porta em porta. O vendedor ou o autor usa sua voz e sua cantoria para atrair compradores. Canta seus versos para despertar a curiosidade.
Os temas são muito variados, mas correspondem a tradição da transmissão oral da história, de fatos corriqueiros ou extraordinários ou comentários sobre a vida política e econômica da região. Tudo parte da imaginação e da observação do escritor.
Nos desafios entre autores, as figuras folclóricas ou reais são um grande atrativo. A disputa é acirrada. Os insultos e provocações dão a tônica do poema.
As figuras religiosas têm um papel destacado como Padre Cícero Romão. Também a valentia e a violência dos cangaceiros, em destaque Lampião e Antônio Silvino, ou mesmo personagens históricos como Zumbi dos Palmares, são personagens constantes da literatura de cordel. Já o diabo é um inimigo constante de heróis ou de intrépidos vaqueiros. O folclore e a Bíblia são grandes fontes de inspiração e de criação.
A literatura de cordel sofreu muitas transformações no decorrer dos anos, desde a mudança do tipo de impressão, passando pela quantidade de versos, até às ilustrações das capas, mas principalmente pelos argumentos dos folhetos que mudaram acompanhando as andanças de seus criadores. Hoje o cordel também é produzido em outros centros como São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Paraná e em outras regiões onde o migrante nordestino se estabeleceu.

Uma forma de arte popular

A literatura de cordel é uma forma de arte popular que utiliza a forma poética para contar uma história em versos divididos em estrofes. Com rimas simples mas precisas os autores percorrem a imaginação dos leitores.
O grande chamativo dos cordéis são as capas. Nos primeiros anos do século XX, os folhetos apresentavam nas capas, o título, o nome do autor e em alguns casos ornamentos tipográficos. As ilustrações foram a forma de atrair com mais facilidade os compradores. Como a impressão era tipográfica a solução encontrada foi a produção de xilogravuras, talhadas em tacos de madeira ou em pedra tipográfica. As ilustrações tinham só um cor e para serem destacadas eram impressas em papel de cores diferentes.
A contra-capa também tinha um papel importante para o autor do cordel. Traz informações úteis como o nome, endereço e até fotos ou desenhos do autor, assim como o endereço da tipografia.
Mas os melhores apelos para uma leitura de um cordel são os títulos. Todos têm que carregar um poder de síntese muito grande, suficiente para motivar a compra e apresentar o argumento principal do romance ou da história.
Apresentamos alguns exemplos de título inusitados: O Futebol no Inferno; O Casamento da Raposa com o Cão; Antônio Silvino, Vida, Crimes e Julgamento; A mulher de Quatro Metros que Anda de Feira em Feira; O Rapaz que Fugiu da Morte e Morreu; A Mulher que Deu a Luz Uma cobra porque Zombou do Bom Jesus da Lapa ou Eu Quero é Ser Madamo e Casar com Feminista.
De produção artesanal e tiragem precária, os folhetos de literatura de cordel ganharam tiragens e periodicidade regular em São Paulo, através da editora Prelúdio, que desde a década de 60, produziu centenas de volumes. Com capas apresentando desenhos coloridos (destacando o traço do quadrinhista Sérgio Lima) ou mesmo fotos de personagens reais das histórias, esses cordéis possibilitaram a melhor divulgação e o estudo cuidadoso da grande produção poética e de seus autores. Os temas também mudaram. A grande cidade industrial moldou os argumentos. Agora a adaptação dos migrantes é o mote principal e logo os personagens mudaram. Os artistas da TV, do cinema e da música substituíram Padre Cícero e Frei Damião. Os políticos e presidentes também ganharam espaço na cantoria e passaram por vilões e por heróis.
As mudanças só enriqueceram a literatura de cordel que ganha fôlego para comentar os fatos do novo século.


Worney Almeida de Souza

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